sexta-feira, 9 de maio de 2008

Apenas um carro quebrado a distância


Era apenas um carro quebrado ao longe. Não tinha importância. A fumaça preta saia devagar e parecia estar dançando ao vento. Era lua cheia e fazia frio, muito frio. Eu o olhava cabisbaixo, sem vontade. Não tinha a menor importância aquele carro quebrado ao longe, mas me instigava. Meus olhos estavam vidrados, não conseguia mudar a direção. Que diabos eu me senti atraído por aquele maldito carro quebrado, batido, provavelmente capotado e quase se incendiando. Eu fazia força pra andar em sua direção, a sensação era de estar levantando mil quilos em cada perna.


Andei a passos lentos nessa estrada sombria e deserta. Ele me assombrava, mas eu não conseguia o evitar. Sentei abraçado aos joelhos por um tempo o qual eu não faço a mínima idéia. Observei. Havia um cheiro de podre no ar. Medo e angústia. Ainda sentado, chorei, e praguejei todos meus receios e vontades. Gritei aos berros todos os palavrões possíveis e desejei estar morto. Eu tinha que ir até lá, eu sentia.


A chuva começou em poucos pingos e logo o céu desabou sobre minha cabeça. Eu estava encharcado, e ali diante dele. Fui em direção à porta do carona, tudo estava amassado, quebrado, destruído. Assim como eu. O cheiro de podre me causava ânsias de vômito, mas eu não hesitava. Abri a porta aos solavancos e levei a mão ao rosto pra não sentir o odor. Um corpo estava debruçado sobre o volante, aparentemente um homem de meia idade. Ela também estava ali, como eu imaginava a encontrar, nesse maldito carro quebrado ao longe. A minha garota, que já não mais tinha vida, nem o sorriso que me encantava. Usava o cordão que eu havia lhe dado no nosso aniversário de namoro. O peguei. A chuva caia cada vez com mais força e junto a ela minhas lágrimas. Ajoelhei-me, e com o que me restava de força gritei desesperadamente de dor.